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Seminário 'Biopolíticas para Mulheres Negras' é aberto em evento no MAM
A exibição do documentário 'Goya Lopes – Coragem de Criar' marcou a abertura do 6º seminário ‘Biopolíticas e Mulheres Negras: Práticas e Experiências contra o Racismo e o Sexismo’, no Museu de Arte Moderna da Bahia (MAM), na noite de ontem, dia 27. O vídeo mostrou um pouco da designer, que é considerada uma das principais precursoras do Brasil na arte têxtil inspirada nas culturas africana e afro-brasileira, tendo ganhado o prêmio Museu da Casa Brasileira em 1993. A abertura festiva do evento foi marcada por uma roda de conversa com a participação da promotora de Justiça Lívia Vaz, da doutora em estudos feministas Carla Akotirene e da cofundadora da Abayomi Juristas Negras e procuradora da República Chiara Michelle Ramos. Na abertura, o coordenador do Centro de Apoio Operacional dos Direitos Humanos (Caodh), promotor de Justiça Edvaldo Vivas, destacou o desafio que consiste levantar a pauta do racismo e do sexismo. “É sempre difícil, sobretudo no momento histórico em que vivemos, mas é gratificante, pois nos conscientiza ainda mais sobre o verdadeiro papel do MP”, afirmou Edvaldo Vivas, que destacou a importância de tratar dessas questões na própria instituição. “Nós aprovamos no ano passado o nosso programa de enfrentamento ao racismo institucional, que discute o racismo estrutural no próprio MP e já estamos elaborando o nosso primeiro censo étnico-racial do MP, para sabermos onde estão os negros no MP”, concluiu.
A promotora de Justiça Lívia Vaz abriu sua fala salientando a importância que o seminário de biopolíticas para mulheres negras tem no mês de julho. “O julho das pretas cresceu e já não se restringe mais ao dia 25, que é o Dia Internacional da Mulher Negra, latino-americana e caribenha, que no Brasil é o dia nacional da mulher negra e de Tereza de Benguela, líder quilombola. Como ela, temos a missão ancestral de abrir caminho para outras mulheres negras”, afirmou Lívia Vaz, destacando a importância do pioneirismo do MP baiano no combate ao racismo estrutural, tendo sido o primeiro MP brasileiro a ter uma Promotoria de Justiça especializada no combate ao racismo. “Essa iniciativa precisa, cada vez mais, ser expandida, pois ainda temos um sistema de justiça onde apenas 5% dos seus integrantes são mulheres negras, enquanto na representação da sociedade, somos 28% da população. Constituímos o maior grupo social da representação da sociedade e não estamos devidamente representadas nos espaços de poder”, destacou Lívia Vaz, que ressaltou a importância do coletivo o ‘Selo Juristas Negras’, que está encampando a campanha Juristas Negras no Supremo Tribunal Federal, espaço que nunca foi ocupado por uma mulher negra.
Na roda de conversa, a doutora em estudos feministas Carla Akotirene falou da interseccionalidade como uma encruzilhada intelectual para o enfrentamento simultâneo do patriarcado, do racismo e do capitalismo. “A luta pela igualdade tem que ser encarada sob o prisma da interseccionalidade, sem mais focar apenas no conceito de classe social. É preciso incluir, com igual peso, as questões de gênero e raça”, afirmou a pesquisadora, que falou da sua experiência de vida. “Com minha mãe, aprendi que meritocracia é uma das grandes farsas do capitalismo, pois ninguém se esforçava mais que ela para pôr o básico na nossa mesa, mas não havia reconhecimento no seu trabalho nem no seu esforço. Hoje, entendo que grande parte dessa desigualdade, talvez a parte maior, se devia ao fato dela ser uma mulher negra”, afirmou Akotirene, que destacou a existência da violência de gênero como algo que atinge gravemente a mulher negra. “Até mesmo o homem negro personifica essa violência, vez que está ainda estruturalmente ligado ao patriarcado, tendo uma falta de compromisso com as questões de gênero”, afirmou a doutora em estudos feministas, salientando que “o que o homem negro tem em comum com o homem branco é o machismo”.
A procuradora da República Chiara Michelle Ramos falou sobre o território como outro desafio estrutural a ser enfrentado. “As políticas públicas não priorizam os bairros onde a predominância populacional é de pessoas negras. A gravidade dessa questão pode ser medida pelo fato de que quando um homem ou uma mulher negra alcançam conquistas sociais e financeiras, uma das primeiras atitudes é deixar o território, se mudando para bairros de predomínio populacional branco”, afirmou, ressaltando o papel do que ela chamou de novos quilombos. “São cada vez mais necessários esses novos espaços de insurgência, muitas vezes estruturados por meio da internet de forma virtual. Espaços como o nosso selo Juristas Negras, que possibilitam uma atuação em rede fundamental para o enfrentamento do racismo e do sexismo estruturais, que atingem as mulheres negras mais do que qualquer outro grupo sociocultural.”. A abertura festiva do seminário, que vai até a sexta-feira, dia 29, foi encerrada com uma apresentação do grupo Samba das Pretas.
Fotos: Rodrigo Tagliaro (Rodtag)
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